Era uma noite meio parada quando a gente se esbarrou na mercearia. Ela vinha com um vinho na mão e a risada de algumas amigas. Eu tinha colocado uma touca e sai de bermudas e chinelos para comprar outro miojo de legumes e umas cervejas na promoção. Na hora do caixa, ela na frente sem me ver, contava uma história sobre o dia em que ela tinha ido no parque de diversões e tinha varado a rede da cama elástica e caído do outro lado, as amigas riam agora com mais força e gesticulando que iam cair no chão, não acreditavam que aquilo tinha acontecido. Ela olhava para a frente, quando se lembrou de que tinha esquecido o manjericão, virou de uma vez e puff, meu miojo voou para o outro lado do balcão e as cervejas se esparramaram pelo chão. Ela se assustou e apertou as duas mãos na face morena e com a voz mais doce me pediu "desculpa", eu olhei pro chão e sorri dizendo que não tinha importância, aquilo tudo era barato e que tinha valido por ouvir a sua história sobre o parque. Ela ficou mais bronzeada de vergonha, mas eu coloquei a mão nos seus ombros. "Essa era a melhor história que eu tinha escutado há meses". Ela olhou para minha mão e eu fiquei meio encabulado. As amigas dela queriam saber o que aconteceu, mas ela apontou para o manjericão e enquanto elas iam buscar as folhas verdes para o molho, me enlaçou com o vinho e colou seus lábios nos meus.
Flor era seu nome. Fui saber disso depois de uns dias, quando encontrei sem querer sua foto de perfil numa rede social. Seguimos de volta a nossa conversa por ali, mas ela era muito ocupada, trabalhava e estudava, mas de vez em quando encontrávamos para alguns beijos esporádicos na pracinha sempre às quintas. Como tudo aquilo era adolescente e diferente dos outros encontros! Era engraçado porque ela ficava com outras pessoas, e eu também, mas ali não. Atrás do coreto, como duas crianças longe dos olhos dos pais e perto dos balanços era só a gente. Mas, um dia acabou. Ela deixou de ir na pracinha na quinta. Não visualizava minhas mensagens, as ligações sempre caiam na caixa postal. Um dia voltei às redes sociais para encontrá-la, nenhum sinal. Tentei encontrar as amigas dela, mas esqueci que não havia perguntado o nome. De tempos em tempos voltava à mercearia sempre à noite e de chinelos para ver se a gente se esbarrava de novo. Nem sinal.
O tempo passou, arrumei um emprego em outra cidade. No dia marcado, levei a mala na escola e caminhei até um ponto de ônibus. Comecei a mexer no celular até o ônibus chegar. Coloquei a mala no bagageiro e entreguei a passagem sem olhar para o cobrador. Eu era o último a entrar, ele já estava cansado. Me pediu a identidade. Abri a carteira e estiquei a mão olhando para o sujeito. Nisso, vinha ela há alguns passos com uma garrafa na mão e de óculos escuros. Todos já estavam lá dentro e a porta prestes a fechar, corri pois não poderia ir embora sem aquela pergunta:
"O que aconteceu? Por que você sumiu?"
Ela demorou alguns segundos para me reconhecer e com um sorriso engraçado bebeu um pouco do keep coller citrus antes de tirar o celular da pequena bolsa à tiracolo.
"Você acredita que eu fui roubada?"
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