A saudade vem antes de tudo ter passado. Saudade da única luz acessa da rua sem saída no alto da madrugada na antiga casa de sempre. Saudade das odes de Alváro de Campos ressoando por todo o quarto, enquanto os pés me levam para lá e para cá por entre as camas que escutavam sem se mexer.
Saudade de hora outra, luz apagada e o olhar iluminando a imaginação que olhava para o breu distante do morro no horizonte enquanto penso, "Onde estão as vacas pretas, pintadas e pardas que pastaram por ali algumas horas antes?".
Saudade da tensão que se acendia logo que o cigarro pega fogo e os braços colavam no beiral, nas horas de bossa daquele disco do Chico. A saudade do fumo me acompanha antes mesmo que o risco do filtro demarque o fim da linha, do mundo em que eu ainda consigo ouvir o som da respiração dos meus avós.
Saudade da dama, que no chão dessa solidão enlaça os braços no meu pescoço e dança comigo aquele samba no escuro, o samba de um só, mas que eu imagino dois. Saudade até do ladrar do cão da casa ao lado, por saber que o tempo me levará e levará tudo isso para o nada, tal qual o Estevão sem metafísica e o poeta que já foi muito antes da tabacaria que deixou de existir.
Saudade.
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